À superfície, parece existir uma tendência para criar uma separação drástica entre a sanidade e a demência, entre o espiritual e o patológico. cabeça fantasma – e o resto do corpo também parte da fricção entre essas categorias para investigar ideias em torno da santidade – e o que a distingue, ou aproxima, da loucura.
A partir da pergunta nuclear da série animais paisagens e santos – “o que é, ou pode ser, um santo hoje?” – esta conferência parte de uma necessidade de criar percursos pelas visões interiores de místicos, profetas e visionários que, ao longo dos séculos, desafiaram os limites do real. A figura do santo como guia para pensar formas de desvio, de atenção ao invisível e de resistência à normalização do pensamento.
Resiste-se à leitura da loucura como disfunção – assumindo-a, antes, como forma de conhecimento –, porque essa leitura é sintoma de um olhar que projecta a sua violência sobre quem que não se ajusta às constrições da normalidade. A loucura não é uma condição individual, mas uma resposta a uma sociedade que dilacerou os seus vínculos simbólicos com a terra e consigo mesma.
Os tempos são sempre de crise, as urgências em resolvê-las vão variando. Esta é mais uma forma de procurar repensar formas de relação com o mundo — possivelmente mais porosas, interdependentes, mais abertas à experiência do que não é obviamente visível.
E põe-se a hipótese de que talvez alguns santos, e as suas loucuras particulares, possam ajudar à desorganização de uma ordem que insiste em tornar-se – outra e cada vez mais – inflexível.
Mais programação do ciclo na Rua das Gaivotas 6 e Teatro Praga.